Workshop realizado no último final de semana da 31ª Bienal com o Movimento Passe Livre, a Rede de Luta do Transporte no Extremo Sul, moradores do Marsilac, Tarifa Zero BH e TarifaZero.org
Busona – Tarifa Zero BH
Guia da 31ª Bienal de São Paulo. Foto: Isabella Rjeille [clique na imagem para ver maior]
Como realizar coisas que não existem
Performance de Graziela Kunsch
4 de agosto de 2015, auditório do Palácio das Artes, Belo Horizonte
A atividade de hoje foi anunciada como uma performance e eu mesma pedi que fosse assim. Mas esta atividade é, antes, um relato de performance.
Um dos meus projetos na 31ª Bienal implicava que a prefeitura de São Paulo colaborasse comigo. Diante da recusa da prefeitura eu busquei outros modos de fazer esse trabalho artístico existir. Tanto o projeto como seu desfecho – ainda inédito – serão apresentados publicamente neste encontro.
Eu fui oficialmente convidada para a 31ª Bienal em janeiro de 2014. Em fevereiro de 2014 era necessário fechar o orçamento dos meus projetos na Bienal junto à produção e ao setor jurídico da Fundação. Eram três projetos grandes – a edição da revista Urbânia 5, um curso de autoformação de educadores, estes dois tendo a educadora Lilian L’Abbate Kelian como colaboradora, e o tal projeto que precisaria da colaboração da prefeitura para existir. Até aquele momento não havia como saber se a prefeitura iria ou não aceitar colaborar na proposta e não havia como orçar o que precisaria ser feito da nossa parte (minha e da Fundação Bienal). O valor total disponível para a realização dos três projetos era de 80 mil reais (menos impostos) e desses a maior parte era destinada à impressão da revista e ao pagamento dos colaboradores da revista (editoras, autores, designer e tradutores). Eu precisava destinar ao menos uma parte para o terceiro projeto e propus que esse item fosse marcado no contrato como uma performance, dado que tudo poderia acontecer, a partir da resposta da prefeitura. A produção concordou e separou 6 mil reais para essa performance, ainda desconhecida por mim mesma, e que poderia ocorrer a qualquer momento nos três meses de duração da exposição (setembro, outubro, novembro e primeiros dias de dezembro).
Antes de contar o que foi o projeto apresentado à prefeitura e que performance realizei com esses 6 mil reais e que performance estou realizando hoje, vou descrever e comentar uma pequena ação relacionada ao projeto, que fiz em três lugares: no Centro Cultural São Paulo, na Bienal e aqui no Palácio das Artes, por ocasião da itinerância da 31ª Bienal, razão da minha presença aqui hoje.
(imagens, descrições e comentários)
projeto O público de fora, CCSP, frase TEM UMA CATRACA NO MEIO DO CAMINHO na entrada. a catraca no transporte e a nova catraca na biblioteca.
frase na área Parque da 31ª Bienal
frase na entrada do Palácio das Artes
introdução projeto apresentado à prefeitura
O meu projeto foi a proposição, para a prefeitura de São Paulo, de uma linha experimental de ônibus, circular, sem destino conhecido. Esse ônibus deveria passar pelas ruas e avenidas da cidade de São Paulo e parar nos pontos de ônibus regulares. A cada vez que o ônibus parasse em um ponto, todas as suas portas se abririam – a da frente, a de trás e a do meio. As pessoas poderiam entrar ou sair por qualquer uma das portas. Dentro do ônibus não haveria uma catraca e ele seria gratuito. Ali na frente, no local onde normalmente se escreve o destino do ônibus, estaria escrito “TARIFA ZERO”.
O ônibus não iria passar pela Bienal, pois minha intenção não era discutir o acesso à Bienal. A ideia era sugerir que o próprio deslocamento é lugar, e estimular outra forma de as pessoas se movimentarem pelas cidades.
(imagens)
carta protocolada para a prefeitura, solicitando reunião
guia da 31ª Bienal
Todos os projetos artísticos presentes na exposição ocupam duas páginas do guia e são representados por aproximadamente duas imagens e um texto. Nas páginas dedicadas ao ônibus Tarifa Zero, os espaços reservados para as imagens estão em branco. E o texto termina assim: “Não há como saber, no momento de redação deste guia, se a prefeitura concordou em realizar esta obra, ou se a artista precisou adaptá-la. Mas o ônibus TARIFA ZERO pode existir ao menos como um projeto – ou como um horizonte, um destino –, num esforço de imaginação coletiva radical”.
A prefeitura não demonstrou interesse em colaborar na realização desse projeto e, como conclusão desse processo, na última semana da Bienal, eu convidei integrantes de movimentos sociais que vem realizando experiências de linhas populares de ônibus Tarifa Zero para uma sessão de trabalho, em que, durante quatro horas, puderam compartilhar suas práticas e estratégias. Estiveram presentes integrantes do Movimento Passe Livre de São Paulo, do Movimento Passe Livre de Ribeirão Preto, da Rede de Luta do Transporte no Extremo Sul, do Movimento Tarifa Zero BH; o editor do portal TarifaZero.org; e moradores da região de Parelheiros (extremo sul da cidade de São Paulo).
(imagens, descrições e comentários)
workshop na 31ª Bienal
experiências de ônibus popular Tarifa Zero da Luta do Transporte no Extremo Sul, SP, e do Tarifa Zero BH (a “busona” Tarifa Zero)
linguagem de cada movimento (SP – punk, preto e branco; BH – cores, carnaval)
aprendizado entre os dois movimentos – a via institucional x o trabalho de base
a importância da base social
a implicação de lutas que se dão só pela via institucional – ciclovia na Paulista, não na periferia (colaborou Daniel Guimarães)
Fora as pessoas que participaram do workshop e seus respectivos movimentos, o que ninguém sabia até hoje é que todos os participantes convidados haviam concordado em doar seus cachês – de 600 reais cada, descontados impostos – para futuras experiências de linhas populares experimentais de Tarifa Zero.
(imagens, descrições e comentários)
semana de ações da Luta do Transporte no Extremo Sul, em maio de 2015, com a realização de três linhas populares, nos três bairros de luta
trechos da entrevista com a militante Luíze sobre como são custeadas essas linhas populares e como foi útil a doação de cachês do workshop realizado na Bienal
as conquistas dessa semana de lutas (a prefeitura finalmente criou uma das linhas exigidas, ainda que com algumas limitações, e ainda aguardam a implantação das outras duas)
Hoje, 4 de agosto de 2015, irei receber o mesmo valor de cachê que receberam os participantes do workshop em São Paulo pela minha presença e pelo meu trabalho aqui. Esse dinheiro, descontados os impostos, será doado para o movimento Tarifa Zero BH, que se encontra em pleno momento de luta para impedir um novo aumento na tarifa de ônibus em Belo Horizonte, realizar uma nova busona. Se as prefeituras não fazem, fazemos nós; tanto para viver, no presente, a experiência da liberdade no transporte, como para ensinar as prefeituras o que e como se pode e se deve fazer. As tais coisas que não existem já existem ao menos no horizonte.
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(Texto de atividade em Belo Horizonte, por ocasião de uma itinerância da 31ª Bienal. Um dia espero desenvolver por escrito os momentos de imagens/improvisação oral, aqui apenas indicados. Leia aqui matéria no jornal O Tempo anunciando a atividade)