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[clique na imagem para ver maior/ler o quadrinho]

Em 2011 fui convidada a participar de uma exposição chamada “Cavalos de Tróia”, com curadoria de Fernando Cocchiarale e Pedro França. Essa exposição era uma das cinco curadorias que compunham o projeto Caos e Efeito, organizado pelo Itaú Cultural com o objetivo de refletir sobre o que fora a arte brasileira nas últimas décadas e também sobre o que seria a arte brasileira nas próximas décadas (!). Todos os curadores-chefe convidados eram homens. Interessada no recorte curatorial “Cavalos de Tróia”, que acolheu obras/documentações de artistas históricos que respeito muito como Anna Bella Geiger, Grupo Rex, Nervo Óptico, Daniel Santiago e Paulo Bruscky, entre outros, num primeiro momento concordei, feliz, em apresentar vídeos do Projeto Mutirão ali. Imaginei também realizar conversas específicas do projeto com a equipe do educativo e com o público ao longo de toda duração da exposição, até saber que nós artistas não receberíamos nenhuma remuneração por nosso trabalho. A montagem da exposição foi bastante acelerada e já haviam até mesmo construído uma pequena sala para a projeção de meus vídeos. Chamei um dos curadores para uma conversa e informei que, no lugar do Projeto Mutirão, eu gostaria de expor um pequeno quadrinho. No meio de um papel branco, escrevi uma frase à mão, à lápis: “Prefiro não fazer”. Meu quadrinho foi acolhido pela curadoria e a salinha imaginada para os vídeos foi usada para abrigar uma vitrine da artista Alice Miceli.

Na sequência desse gesto (o quadrinho, a frase) escrevi a base de uma carta à ­instituição e convoquei as/os aproximadamente 70 artistas participantes das cinco exposições para reivindicarmos a nossa remuneração. A carta teve adesão quase total e a nossa demanda foi ouvida. Recebemos o valor simbólico de R$ 1.000,00 por nossa participação.

A recusa presente em “Prefiro não fazer” e a carta coletiva foram uma resposta crítica precisa ao projeto curatorial “Cavalos de Tróia”, assim descrito no site do Itaú Cultural:

“Fernando Cocchiarale – em cocuradoria com Pedro França – demonstrou em seu recorte curatorial a crítica embutida nos processos de concepção, produção da obra e sua inserção no sistema artístico. Essa proposta, que vai contra a noção mercadológica da arte e que ganhou força no Brasil nas décadas de 1960 e 1970, procurou questionar os fundamentos desse sistema, sua ideologia e a crença no objeto artístico como o único resultado aceitável do trabalho do artista”[1].

Após essa exposição o quadrinho foi exposto em outros contextos, a cada vez com outras motivações/outros significados: Campo neutral (Museu da Gravura de Curitiba, 2013, curadoria de Felipe Prando); Frestras – Trienal de Artes de Sorocaba, recorte Poipoidrome (SESC Sorocaba, 2015, curadoria de Josué Mattos); e Elefante branco com paninho em cima (MIS-SP, 2016, colaboração com Jorge Menna Barreto/rejeitados e curadoria de Ana Maria Maia).

Graziela Kunsch

[1] Ver http://www.itaucultural.org.br/explore/artes-visuais/projetos/hotsite/?id=60158 . O texto curatorial completo pode ser lido em http://portalicuploads.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/2012/08/Sobre-Cavalos-de-Troia.pdf . Último acesso em 18/3/2016.